Esta semana fui convidado, como professor da PUCPR (essa é nova, e vai merecer um post logo mais) a fazer uma matéria pra SBT (rede Massa) e falar sobre o porquê algumas músicas como eu "quero tchu..." (ou como diabos se chamar) são tão grudentas e ficam gravadas na memória da galera.
Claro, meu tempo dentro da matéria era de 30 segundos, tempo que não serve nem pra dizer o nome completo, mas como não tinha q fazer isso tentei ressumir radicalmente o que tinha preparado. Como obviamente o tempo para esclarecer coisas que podem ser de interesse do público é bem menor do que o tempo da publicidade, provavelmente ainda será editado, motivo pelo qual estou torcendo que o editor tenha o bom senso de manter alguma logica no que eu disse (se é que ele tinha alguma, né?)
Pensei então que talvez devia aproveitar os meus raciocínios e publicá-los em algum lugar... e que lugar melhor que este, que é o lugar onde eu falo o que eu quiser, sem edição...hehehe
Bom, dito isto irei direto ao assunto:
Eu acredito que a popularização de alguns eventos (como neste caso uma canção popular, a citada "eu quero não-sei-o-que" ou outras melecas do gênero) ao ponto de se tornarem sucessos comerciais e de popularidade não tem um único motivo, e são, portanto, multifatoriais.
Descreverei alguns que eu consegui detectar, mas é possível que muitos mais contribuam pro resultado final:
- Estruturas musicais e literárias fáceis. Quando combinamos dois ou mais sons estamos criando uma estrutura sonora. Algumas combinações soam a samba, outras a jazz e outras a música chinesa. Uma pessoa que nasceu no morro terá contato mais frequente com o primeiro tipo, portanto a música que possui estruturas semelhantes ao samba conhecido será percebida como algo familiar, a diferencia das outras, que soarão estranhas, ou pouco familiares.
Nosso cérebro têm uma tendencia natural à economia de esforço. Provavelmente por motivos ecológicos ou de supervivência, evolutivamente, economizar esforço pode resultar em que uma parte dessa energia poupada possa nos ajudar a nos protegermos, estando alerta frente a potenciais predadores, ou para conseguir recursos como alimentos, moradia, etc. Assim, processar a informação de estruturas sonoras (e literárias) familiares consome pouco processamento cerebral, enquanto gêneros mais complexos como rock progressivo, jazz ou música de outras culturas requerem mais energia para interpretá-las.
Todo mundo sabe que fazer exercício ou atividade física são muito importantes (senão necessários) para nossa saúde, mas não todo mundo que vai frequentemente na academia, e fica sentado no sofá assistindo a novela (que representa pouco esforço intelectual).
Da mesma maneira resulta com a música: estruturas fáceis e familiares são mais "leves" e podem ser curtidas sem esforço nenhum. A diferencia da vida biológica, na vida intelectual, a poupança de energia de processamento pode ser vista como preguiça intelectual. Nosso cérebro se joga no sofá e deixa que só a música fácil o atinja. Como acredito que hoje seja muito difícil ser atacado por uma preguiça gigante ou um tigre dente-se-sabre, não vejo porquê não dedicar um pouco de nossa capacidade intelectual para escutar e degustar a música de Yes, Stockhausen ou a poesia de Chico Buarque ou Borges. - Grupos de referência. Vivemos inevitavelmente inseridos dentro de contextos. Esses contextos correspondem a grupos sociais com os que trocamos referências. Se uma pessoa que lê Einstein encontra-se num grupo que assiste periodicamente (e exclussivamente) a novela das 8 provavelmente não vai ter com quem conversar. Ser diferente da massa requer muita coragem, e uma boa dose de segurança, para suportar os momento em que não teremos com quem conversar. Mas é muito frequente que os gostos e preferências das massas acabem por influencias nosso próprio gosto, afinal, todo mundo quer ter alguém por perto. Massas são facilmente influenciáveis como o observaram Ortega y Gasset (La rebelión de las masas) y Adorno (O fetichismo na música e a regressão da audição).
- O sistema capitalista. Nossa cultura ocidental não é nem espiritualista nem intelectualista e sim capitalista. Isto quer dizer que o "valor" de nossa sociedade, sobre tudo nos últimos anos em que o capitalismo empresarial de pequena escala mutou para o capitalismo monopolista, não é outra coisa que o o dinheiro e suas formas de poder. Assim, podemos ver como um jogador de futebol ganha milhões enquanto um professor não chega poucos milhares. Este jogador não ganha isso porque seu trabalho vale mais e sim porque gera e movimenta mais dinheiro, em termos de publicidade, merchandising e tal, enquanto o professor, que educa o povo, não gera para o sistema "valores" à altura do esportista. O mesmo acontece com a música, com com outras manifestações artísticas e culturais. Alguém lucra com a venda e divulgação de músicas fáceis, que são mais facilmente vendáveis que outras de estruturas mais complexas o sofisticadas.
- Fenômenos mediáticos. Se figuras mediáticas como Neymar ou Rafinha Bastos apontam para tal o qual evento, por transferência, esses eventos acabam caindo no conhecimento das massas. O mesmo acontece com valores negativos. Se alguém que está em descredito aponta algo, este será rejeitado pelas massas, ou se alguém que está em alta fala mal de algo será, imediatamente, defenestrado pelos seus seguidores. As figuras citadas acima ofereceram claros exemplos pouco tempo atrás.
- Linguagem direta. A música "Psiú, beijo me liga, estou curtindo a noite, te espera na saída" falava na mesma língua que es pessoas que estavam consumindo esse tipo de música, nesses lugares e eventos específicos. Pessoalmente, no caso dessa canção, acho uma sacada inteligente. Dar ao público o que ele quer e o que ele entende é a melhor maneira de cair nas graças deles e, consequentemente, virar popular.
- Finalmente, devemos reconhecer que algumas músicas são muito bem boladas mesmo, embora sejam estas uma grande minoria.
Espero ter sido suficientemente claro.
Como já disse, devem existir provavelmente outros fatores.
Este "insight" não pretende ser conclusivo nem exaustivo e sim, apenas minha vontade de deixar mais claro meu pensamento, que acredito, por questões de tempo televisivo, não será na reportagem.
Mas foi legal poder ter refletido sobre o assunto.
Obrigado por terem chegado até aqui... hehe
5 comentários:
Dinada. ;)
Grande Jorge!!! Excelente texto, meu amigo!!!!!!
Onde é que eu assino?? ;-)
Muito bom!!!
Grande Falcon, muito bom o texto. Abração.
realmente...se vc não fala de uma "agenda pública" por exemplo: sobre a atitude daquela BBB(sei lá qual) não tem com quem ou o que conversar...infelizmente! Mto bom o texto. Abraço; Marilse.
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